Não escrever um romance na «horizontal», com a narrativa de peripécias que entretêm. Escrevê-lo na «vertical», com a vivência intensa do que se sente e perturba.
Vergílio Ferreira
Depois de Pedro Passos Coelho ter garantido publicamente que não se recandidatar à liderança dos social-democratas, outro Pedro, Santana Lopes admitiu ontem à noite na SIC Notícias estar a «ponderar obviamente» uma candidatura à liderança do partido.
Santana Lopes não consegue deixar de ser ele próprio. Está sempre disponível, mesmo quando não está. Como ninguém o quer no PSD, fez logo questão de vir a terreiro dizer que está a pensar avançar. Só para mostrar que está vivo. Só porque está melindrado por ninguém pensar nele para a presidência do partido. Pedro Santana Lopes é e será o eterno candidato.
Rui Rio parece ser o líder que se segue dos sociais-democratas. O antigo presidente da Câmara Municipal do Porto tem estado a ouvir notáveis social-democratas. A decisão de avançar com uma candidatura à liderança deverá ser anunciada talvez na próxima semana. Rui Rio é o nome mais forte para a corrida à liderança laranja, mas poderão surgir outros. André Ventura também já se mostrou disponível e Paulo Rangel, como já se percebeu, também não rejeita essa possibilidade.
Mas o homem indicado é bem capaz de ser Rui Rio. É uma ambição antiga do político portuense que pode ser satisfeita nesta altura. Um leader social-democrata como Rio, do lado esquerdo do partido, é interessante sob o ponto vista político e poderá colocar novos desafios a António Costa. Ainda poderá eventualmente criar-se uma solução tipo bloco central.
Como era expectável, o PS foi o grande vencedor das eleições autárquicas, sendo que PSD e CDU foram os grandes derrotados. A votação no PS foi histórica, revelando que o partido está forte e a governação de António Costa está bem e recomenda-se.
Estas eleições são por vezes um teste à governação. Assim sendo, o PS obteve nota muito positiva, já que não apenas reforçou a sua votação, como ganhou câmaras importantes à CDU como Almada, Alcochete, Barreiro, Barrancos, Moura e Beja, conquistando, ainda, bastiões “laranja” como Mirandela, São João da Madeira, Chaves, Ansião, Pedrógão Grande ou Felgueiras.
Rui Moreira também foi um vencedor. Alcançou o segundo mandato no Porto, tendo obtido maioria absoluta e, apesar das divergências com Manuel Pizarro, os eleitores ainda assim mostraram que confiam em Moreira para presidir ao Município do Porto.
Assunção Cristas foi igualmente vencedora. Fez uma aposta arriscada candidatando-se à Câmara de Lisboa e deu-se bem com isso. Cristas ficou à frente de Teresa Leal Coelho, candidata do PSD, com quase o dobro da votação. No Porto apoiou Rui Moreira e ganhou igualmente com isso. Cristas sai, por isso, reforçada destas eleições.
Isaltino foi outro dos grandes vencedores da noite. Goste-se ou não, Isaltino regressa pela porta grande, com maioria absoluta em Oeiras, depois de ter sido condenado e preso e se ter candidatado sem qualquer apoio partidário.
Em sentido oposto, a CDU foi uma das derrotadas da noite. Os comunistas perderam dez câmaras face a 2013, entre as quais algumas emblemáticas como Barreiro, Almada e Beja. A votação global e o número de vereadores também caíram. Resta saber se estes resultados poderão afetar as relações com o parceiro de coligação no seio da geringonça.
O PSD em geral e Passos Coelho em particular foram os grandes derrotados destas eleições. É certo que a derrota era esperada, mas a hecatombe foi pior do que se previa. Foi um péssimo resultado para o PSD, mesmo depois do pior resultado de sempre nas autárquicas de 2013.
A votação de Lisboa e Porto, em especial, foi desastrosa, com responsabilidades imputáveis diretamente a Passos Coelho, pela escolha dos candidatos. O líder do PSD sai destas eleições numa posição muito fragilizada e a sua demissão é quase um imperativo. Como disse José Miguel Júdice na noite eleitoral, na TVI, «Passos está morto politicamente e ainda ninguém lhe disse».