As rendas excessivas da eletricidade.
Numa altura em que continua adiada a acusação relativa à Operação Marquês, são agora as rendas excessivas da eletricidade a perfilarem-se na agenda mediática.
O processo tem nove arguidos, entre eles, o ex-ministro da Economia Manuel Pinho, o presidente-executivo da EDP, António Mexia.
O tema tem marcado os vários governos e a discussão política ao longo dos anos. O episódio mais mediático foi a demissão do secretário de Estado da Energia do governo de Passos Coelho, Henrique Gomes.
A investigação às rendas excessivas no setor da eletricidade foi aberta em 2012, está a ser conduzida pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e decorre no âmbito de um processo que abrange os contratos CMEC (custos de manutenção do equilíbrio contratual) que foram criados em 2004, no Governo de Durão Barroso, na sequência da liberalização do mercado da eletricidade. Neste processo é também investigado o prolongamento da concessão de várias barragens à EDP, em 2007. Este prolongamento permitiu à EDP continuar a receber os pagamentos dos CMEC referentes a estas barragens por muito mais tempo. O ministro da Economia que decidiu os pagamentos dos CMEC e do prolongamento das barragens foi precisamente Manuel Pinho, no Governo de José Sócrates.
Mais tarde, quando saiu do cargo, Manuel Pinho foi dar aulas em Nova Iorque, no curso de eólicas da Universidade de Colúmbia, acumulando essas funções com as de administrador do BES Africa. Posteriormente, desviculou-se do BES, negociando uma reforma antecipada que viria a ser cancelada pelo Novo Banco.
Na senda do Ministério Público está agora o patrocínio de 1,2 milhões de euros pagos pela EDP à universidade norte-americana de Columbia, através de uma sociedade offshore (a Tartaruga Foundation, com sede no Panamá), dos quais 500 mil euros foram recebidos enquanto era ministro de José Sócrates, o que permitiu que Pinho lá tivesse começado a dar aulas sobre energias renováveis em 2010. As ordens de pagamento terão sido realizadas pelo líder do antigo BES, Ricardo Salgado.
Este facto é tanto mais relevante porquanto Manuel Pinho é suspeito de ter tomado um conjunto de decisões em termos de legislação de produção e venda de eletricidade, enquanto titular da pasta da Economia que terão beneficiado a EDP num total de cerca de 1,2 mil milhões de euros. Sendo certo que o BES chegou a ter 3% do capital social da EDP, usufruindo indiretamente desse alegados benefícios enquanto acionista.
Refira-se que os portugueses têm de pagar um total de 3,9 mil milhões de euros de custos de eletricidade, entre 2000 e 2020, devido a rendas excessivas, o que significa que isto representa um custo de 390 euros por pessoa, no prazo de duas décadas.
No entanto, o secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches deu luz verde às contas finais feitas pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), que reconheceu pagamentos de 154 milhões de euros à EDP, menos 102,5 milhões que os cálculos pedidos pela elétrica. As contas da empresa liderada por António Mexia apontam para valores a receber entre 256,5 milhões de euros e 271 milhões. A diferença de mais de 100 milhões de euros poderá levar a EDP a contestar nos tribunais os pagamentos.
O corte destas rendas terá certamente impacto direto nas tarifas de eletricidade, ao baixar os custos do sistema elétrico, pagos através da fatura da luz e e que faz com que Portugal seja dos países com a fatura elétrica mais alta, o que contradiz a afirmação de António Mexia: «A eletricidade não é cara. As casas é que são mal construídas». A eletricidade é de facto cara por más decisões políticas.