Não escrever um romance na «horizontal», com a narrativa de peripécias que entretêm. Escrevê-lo na «vertical», com a vivência intensa do que se sente e perturba.
Vergílio Ferreira
Morreu Otelo Saraiva de Carvalho aos 84 anos. Homem corajoso, idealista, sonhador e polémico. Joga a seu favor o papel fulcral que teve na Revolução dos Cravos, como o estratega que dirigiu as operações do 25 de Abril, a partir do posto de comando clandestino instalado no Quartel da Pontinha.
Após a revolução, Otelo foi Comandante da Região Militar de Lisboa e Comandante do COPCON, tendo pertencido ao Conselho da Revolução. Fica responsável pelo sector operacional da Comissão Coordenadora do MFA, tendo sido afastado do cargo e substituído por Vasco Lourenço, na sequência da tentativa de golpe do 25 de novembro de 1975, em que esteve envolvido, e cujo fracasso resultou no fim do PREC.
Candidatou-se como independente às eleições presidenciais de 1976 e às de 1980, ano em que criou o partido Força de Unidade Popular (FUP), tendo, pelas duas vezes, sido derrotado por Ramalho Eanes.
Em 1984, foi acusado e julgado por ser o líder das FP-25, responsável por vários atentados e mortes. Foi condenado a 15 anos de prisão. Esteve preso cinco anos, tendo sido libertado por indulto da Assembleia da República em 1991, e cinco anos depois foi amnistiado a pedido do então presidente da República, Mário Soares.
Como afirmou o Presidente da Republica, será porventura cedo para a história julgar a sua coragem, o seu voluntarismo, o seu arrebatamento e os seus erros, com a “devida distância”, porém, não obstante todas os excessos que cometeu, ficará na nossa memória, pelo menos na minha, como figura maior do 25 de Abril.
No passado domingo, algumas pessoas manifestaram-se, em Lisboa e no Porto, contra o certificado digital e a utilização obrigatória de máscara, exibindo cartazes e t-shirts com a seguinte mensagem: “Não há ditadura sanitária”
À primeira vista poder-se-ia pensar: se não há ditadura sanitária porque é que fazem manifestações contra a ditadura sanitária?
Acontece que as t-shirts continham um erro ortográfico grosseiro que mudava completamente o sentido da frase: em vez de “Não à ditadura sanitária”, os manifestantes tinham camisolas a dizer “Não há ditadura sanitária”.
Escreveram, mandaram fazer t-shirts, vestiram, olharam e ninguém viu a calinada!?
A detenção de Luís Filipe Vieira (LFV) só surpreende os mais incautos, porque os sinais estavam todos lá: indícios fortíssimos de corrupção, tráfico de influências, abuso de poder e branqueamento de capitais.
O procurador Rosário Teixeira, responsável por esta investigação e o juiz Carlos Alexandre detiveram o presidente do Benfica para interrogatório por, alegadamente, estar envolvido num esquema de fraude montado em proveito próprio e das suas empresas à custa do prejuízo dos interesses do Benfica e SAD, do ex-GES e do Novo Banco e do Estado português, quer em sede de fuga ao fisco, quer em sede de financiamento público ao Fundo de Resolução e ao mecanismo de acordo de capital contingente (pelos prejuízos causados ao Novo Banco pelas dívidas não pagas pelas empresas de Vieira).
Para montar todos estes esquemas, o presidente do Benfica terá contado com o apoio do filho, Tiago Vieira, e do empresário de futebol, Bruno Macedo, através do agenciamento de jogadores e de intermediação em transferências, com recurso a documentos falsos, de forma a transferir quantias para as suas empresas e do empresário José António dos Santos, conhecido como 'Rei dos Frangos'.
LFV ainda não foi constituído arguido, está apenas detido para interrogatório judicial, e deve, por isso, gozar do princípio da presunção de inocência, até que a sentença seja transitada em julgado, mas o julgamento já está a ser feito na praça pública e, inocente ou culpado, o seu nome ficará manchado para sempre, sobretudo aos olhos dos benfiquistas que não lhe irão perdoar o facto de ter lesado o clube.
Uma coisa é certa: a partir de agora, LFV não tem condições para voltar a dirigir o Sport Lisboa e Benfica nem a Benfica SAD. Aliás, ele sempre afirmou que se demitiria se por acaso fosse constituído arguido em algum processo. Por isso, deverá renunciar, de imediato, ao mandato, para não arrastar o Benfica para a o lamaçal, e preservá-lo de situações que estes processos judiciais sempre envolvem. Já bem basta os danos reputacionais de que o Benfica já não consegue livrar-se, com impacto na imagem do clube e na equipa de futebol.
O vice-presidente, Rui Costa, é o candidato mais forte a substituir Vieira, pela ligação ao futebol e por até ter sido identificado como possível sucessor do atual presidente. No caso da SAD, a gestão continua a ser assegurada pelo Conselho de Administração e as decisões urgentes assumidas pelo seu CEO, Domingos Soares de Oliveira. De qualquer forma, Rui Costa, que é igualmente administrador da SAD, terá um papel decisivo nos processos relativos a transferências de jogadores, mas o mais correto seria convocar eleições e dar voz aos sócios.