Ainda Estou Aqui
Fui ao cinema ver Ainda Estou Aqui. Há muito que não via uma sala de cinema tão cheia. O filme vale mesmo a pena ser visto. Se não o viram, não o percam.
Dirigido por Walter Salles, o filme é baseado no livro de memórias de Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice Paiva, e descreve a história da sua família, no início da década de 1970, contando os horrores enfrentados, após sofrerem um ato violento e arbitrário do governo militar que mudou radicalmente o rumo das suas vidas.
Eunice Paiva (interpretada magistralmente por Fernanda Torres), é uma mulher com cinco filhos que viu a sua vida e a da sua família, ser bruscamente transformada, após o sequestro do seu marido (Rubens Paiva, interpretado por Selton Mello) por agentes do regime militar.
Num contexto de tragédia, Eunice Paiva emerge como uma figura de caráter e de força, assumindo com coragem, dignidade e firmeza a sua vida e a dos seus filhos, numa busca incessante pela justiça. Em vez de reações emocionais, Eunice opta por se resguardar, mantendo uma postura digna, sem melodramas, quando tudo à sua volta parece desmoronar. Há uma imagem forte do filme: uma fotografia de família em que a mãe pede para todos sorrirem, vincando bem que nenhuma ditadura, seja ela qual for, consegue impedir alguém de sorrir e de lutar contra regimes totalitários. O contraste entre a tragédia que se abateu na vida da família e a forma como Eunice tenta encarar tudo isto é, a meu ver, um dos maiores sucessos deste filme.
O tempo é, sem dúvida, outro dos elementos marcantes do filme: o tempo em que no Rio de Janeiro, a família Paiva – Rubens, Eunice e seus cinco filhos – vive feliz à beira da praia com uma casa de portas abertas para os amigos; o tempo em que Eunice e a sua filha de apenas 15 anos foi levada pela polícia militar para prestar declarações; o tempo em que a casa da família passou dias ocupada por militares; o tempo que corre, as memórias que ficam, as memórias e que se escondem no fundo da alma e no corpo de Eunice que vai envelhecendo e degradando ao longo do filme.
Walter Salles conseguiu imprimir uma narrativa profunda e emotiva em Ainda Estou Aqui, trazendo à tona as questões da perda, da coragem e da resiliência, enquanto retrata um dos períodos mais sombrios da história do Brasil. A obra é também uma homenagem à força de Eunice Paiva que, contra todas as adversidades, lutou em busca da verdade e tornou-se uma figura preponderante na luta pelos direitos humanos no país.
O filme que tem levado muitos espectadores às salas de cinema, em todos os países onde está em exibição, já ganhou um Globo de Ouro e está nomeado para os Óscares de Melhor Filme, Melhor Atriz (Fernanda Torres) e Melhor Filme Estrangeiro.