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Narrativa Diária

Não escrever um romance na «horizontal», com a narrativa de peripécias que entretêm. Escrevê-lo na «vertical», com a vivência intensa do que se sente e perturba. Vergílio Ferreira

Narrativa Diária

Dom | 26.01.14

Bloco de Esquerda, que futuro?

 

O Bloco de Esquerda teve uma ascensão meteórica devido à ousadia dos seus militantes em pisar terrenos outrora exclusivos aos partidos ditos tradicionais, com a vantagem de trazer ao espaço público uma mensagem de modernidade, bem construída, arejada, sem a lengalenga dos discursos mainstream. Por outro lado, o discurso do seu líder, Francisco Louçã, foi uma pedrada no charco. Louçã afirmou-se, com mais ou menos demagogia, como um dos mais carismáticos líderes políticos nacionais da última década, sendo o principal responsável pelo nascimento, afirmação e crescimento do partido que chegou a ser a quarta força parlamentar com 16 deputados na Assembleia da República.

Francisco Louçã era um político sagaz, calculista que falava muito para além das fronteiras partidárias e até da zona ideológica dos bloquistas. Com o apoio manifesto da comunicação social, o Bloco pegou em alguns temas, em matéria de costumes e tendências sociais, caso do aborto, das drogas leves e do casamento homossexual e recolocou-os na agenda política. Enquanto estes temas marcaram a agenda, o partido foi marcando pontos no espectro político, até ao momento em que começou a perder terreno, tendência que se tem vindo a acentuar e que parece ter vindo para ficar.

Com a saída de Louçã, o desafio que se colocava a quem se lhe seguisse era, antes de mais, manter o partido como um bloco unido, mas sem perder a sua coerência. A sugestão feita pelo próprio Francisco Louçã de que a próxima liderança deveria ser bicéfala era sintomática do estado latente de desagregação do partido. Os deputados João Semedo e Catarina Martins pareciam significar a tentativa de contentar as muitas sensibilidades existentes no Bloco. Acontece que com a saída do seu líder histórico, emergiram os tiques e vícios estruturais das pequenas fações que constituem o partido. Os temas sociais que o BE introduziu na discussão política são hoje pacíficos, até para grande parte da direita. Os sinais de modernidade que os bloquistas haviam trazido à política portuguesa pareciam esgotados. E outros manifestamente inadequados. Mas, nenhum parece ter sido tão desajustado como a liderança bicéfala que sucedeu a Louçã, na tentativa de superar as restantes forças partidárias em demonstrações de igualdade de género, que manifestamente não resultou, por mais sonantes que sejam as intervenções de Catarina Martins e por mais experiente, respeitável e estimável que seja  João Semedo. E não resulta porque dispersa a mensagem e induz uma ideia de fragmentação na opinião pública, quebrando a identificação dos portugueses com o projeto bloquista.

Acresce que com a saída dos seus elementos mais mediáticos e ativos, Daniel Oliveira, Rui Tavares e agora de Ana Drago o BE ficará como muito pouca margem de manobra.

Sem uma implantação forte no poder local e no mundo do trabalho e uma presença apagada no mundo sindical, as atuações do BE parecem ir a reboque dos discursos do Partido Comunista que obviamente lhe ganha em experiência e implantaçao social.

No futuro, apenas uma convergência com outras forças de esquerdas (3D e Livre) poderá evitar um futuro trágico do BE. Uma refundação do partido a partir de um acordo entre as três correntes existentes, não muito diferente, afinal, daquilo que esteve na génese do BE.

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