Chumbos e retenções
Uma das propostas do Governo na atual legislatura, na área da educação, foi o fim das retenções de alunos até ao 9.º ano de escolaridade. A medida, como seria de esperar, teve forte contestação por parte dos partidos à direita do PS, durante o debate quinzenal no Parlamento, levando a um aceso debate em que Rui Rio acusou o governo de estar a apostar no facilitismo e instituir «passagens administrativas».
O primeiro-ministro foi respondendo às críticas da oposição a partir de teses mencionadas em relatórios, que apontam a retenção como uma medida negativa no percurso escolar do aluno.
A taxa de retenções em Portugal nunca foi tão baixa, sendo superior no ensino secundário, em que atingiu um valor de 13,6% em 2017-2018, quando no ano letivo 2008-2009 se situava nos 18,7%. No ensino básico, passou de 7,6% para 5%. Mas o país ainda continua a integrar a lista dos países com os piores resultados. Atualmente, quase 35% dos alunos com 15 anos contam com pelo menos um chumbo no seu currículo.
De acordo com os dados do Ministério da Educação, cada reprovação custa aos cofres do Estado cerca de cinco mil euros por aluno, valor que deverá ser agora poupado com o plano de não retenção no Ensino Básico. Durante a legislatura, a poupança poderá mesmo ser de mil milhões de euros.
Apesar desta poupança, esta medida não tem gerado consenso. Os professores reagiram com indignação, enquanto as famílias aplaudiram a medida.
É uma revolta que tem razão de ser porque há o receio de que se caminhe para uma solução administrativa de abolir as retenções, medida que não combateria o insucesso escolar, nas palavras do secretário-geral da Federação Nacional de Educação. Muitos professores consideram que já existe forte pressão para aprovar os alunos e temem que essa pressão aumente.
A consequência imediata será que muitos alunos não se esforçem e progridam, sem saberem o suficiente e sem estarem preparados para adquirir os conhecimentos que vão ser ensinados no ano seguinte. Além de irem acumulando dificuldades, esses alunos concluem que é possível passar de ano sem estudar e sem aprender e no ano seguinte voltem a não se empenhar.
A tutela garante que o objetivo é eliminar de forma administrativa a figura da retenção, delineando-se um programa «que assente em medidas pedagógicas» que promovam a «aprendizagem de forma mais individualizada, visando a progressiva redução das retenções».
Ora, como se sabe, tudo isto é muito bonito no papel, porém a elevada média de idades dos docentes portugueses associada a níveis elevados de exaustão e stress profissional comprovados por diversos estudos e a falta de motivação não creio que venha facilitar a implementação destas medidas.
Mesmo dando de barato que os professores estavam motivadíssimos e empenhados em resolver as carências de alunos com mais problemas de aprendizagem que tempo teriam para o fazer? Não só por esta razão, as turmas deveriam ser redimensionadas e promovida uma desburocratização do trabalho nas escolas e algum ajustamento na sua organização e funcionamento o que certamente libertaria tempo aos professores para trabalho com a turma ou em apoios que promovessem qualidade e o sucesso escolar.
Julgo que a qualidade do ensino e por inerência o insucesso escolar não se combate com uma cultura de facilitismo, mas antes com uma avaliação regular das aprendizagens, mas também com a avaliação dos professores, com a definição de currículos adequados aos novos tempos, com a estruturação de dispositivos de apoio aos alunos e aos professores, mediante a definição de políticas educativas que sustentem um quadro normativo com modelos adequados de autonomia, organização e funcionamento das escolas e com a definição de objetivos concretos de curto e médio prazo.