Haverá condições para um governo com suporte maioritário à esquerda?
Após ouvir todos os partidos com representação parlamentar, Cavaco Silva já terá sido devidamente elucidado que PS, PCP, BE e PEV inviabilizarão no parlamento uma solução que passe por indigitar Passos Coelho e a coligação de direita.
Ainda assim, o Presidente da República deve indigitar Passos Coelho, convidando-o a formar governo.
Caso António Costa tenha ultrapassado todos os pontos que estavam pendentes na negociação com PCP e BE no momento da entrada em funções do governo de Passos Coelho e tenha a garantia plena de um acordo firme e público que envolva toda a esquerda na governação e na sua sustentação, o governo da Coligação PSD/CDS será chumbado no Parlamento – caso os deputados do PS acatem a disciplina de voto – e esta será porventura a prova legítima e cabal de que o governo de direita não tem viabilidade, o que obrigará Cavaco a passar ao plano B, ou seja, dar posse a um governo de esquerda estável. Entretanto, o quadro constitucional e a correlação de forças existente na Assembleia da República em nada impedem o PS de formar governo, apresentar o seu programa e entrar em funções.
Caso se atalhasse caminho e o procedimento anterior não fosse observado, dificilmente o governo de esquerda poderia vingar ou teria certamente uma vigência curta.
É de facto um momento histórico que marca um momento de mudança na relação entre o PS e os dois partidos à sua esquerda. Se o PS reconhece atualmente o PCP e o BE como partidos com legitimidade para serem partidos de poder e fazerem parte do chamado «arco da governação», o PCP e o BE fazem claramente a distrinça entre o PS e a Direita. Recorde-se que durante décadas, nenhum deles deu esse benefício ao PS. Foram precisos quatro anos de doses cavalares de austeridade para que um e outro dessem passos nesse sentido.
Algumas propostas que poderão ser postas em prática, caso seja viabilizado um governo maioritário de esquerda:
– Valorização dos salários, designadamente o aumento do salário mínimo nacional para 600 euros no início de 2016 (o PS queria estabelecer este valor até ao fim da legislatura, mas o PCP impõe esta medida já para o início do próximo ano e não transige), e do valor real das pensões de reforma;
– Combate à precariedade, designadamente com alterações à legislação laboral e a aprovação de um Plano Nacional de Combate à Precariedade;
– Reposição dos direitos na legislação do trabalho, designadamente de valorização da contratação coletiva;
–Reposição dos salários, pensões, feriados e outros direitos cortados, nomeadamente dos complementos de reforma;
– Implementação de uma política fiscal mais justa que tribute fortemente os grupos económicos e financeiros e alivie os impostos sobre os trabalhadores, os reformados e pensionistas, os micro, pequenos e médios empresários;
– Reforço e diversificação do financiamento da Segurança Social e a garantia dos apoios sociais, designadamente do abono de família, subsídio de desemprego e subsídio social de desemprego;
– Contratação de médicos, enfermeiros de família e outros profissionais para o SNS, a reposição do transporte de doentes não urgentes e a eliminação das taxas moderadoras;
– Reversão dos processos de concessão, subconcessão e privatização, designadamente das empresas de transportes;
– Revogação da recente alteração à lei da interrupção voluntária da gravidez.
Em Tempo: Se o acordo entre a esquerda não for consumado até à apresentação do Programa a apresentar por Passos Coelho, o PS deverá honrar o compromisso de António Costa quando deixou claro que não participaria numa coligação negativa para derrubar um Governo da direita caso não tivesse uma alternativa maioritária.