Novo Estado de Emergência
A evolução da pandemia começa a dar sinais de alarme, numa altura em que o número de novos casos e de óbitos suplanta os valores de abril.
O Governo precisava de dar um novo “abanão” ao país e como tal, após um Conselho de Ministros Extarordinário, o primeiro-ministro anunciou novas medidas de combate à pandemia, com incidência em 121 concelhos mais afetados pela infeção de SARS-CoV-2, a fim de para evitar a rutura do Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas sem comprometer a economia. O desafio é conseguir combater a pandemia sem pagar custos elevados dos pontos de vista social e económico.
Porem, o anúncio das principais medidas não trouxe novidades significativas ou relevantes. Vejamos: mantém-se a regra básica, para estes 121 municípios, do «dever cívico do recolhimento domiciliário» (que não é uma obrigação mas uma recomendação e que mantém o aconselhamento ao mínimo de mobilidade e circulação); da limitação de eventos com o número máximo de 5 pessoas(já existente); do encerramento dos espaços comerciais às 22h00 (sem considerável impacto dada a baixa procura neste horário) ou do encerramento da restauração às 22h30 que, quanto muito, poderá fazer-se sentir mais ao fim-de-semana.
De novo, há a proibição das Feiras e Mercados de Levante (com a justificação da dificuldade na segurança, distanciamento e higienização), entretanto já revertida, sendo agora da responsabilidade das Autarquias e o teletrabalho que, esse sim, é um procedimento que reduz os ajuntamentos nos locais de trabalho e a pressão nos transportes públicos.
Mas continuo a achar que todas estas medidas são manifestamente insuficientes e que há uma certa candura da parte do governo quando coloca a tónica na responsabilidade individual. Pedir às pessoas para ficar em casa, exceto se tiverem de sair e fazê-lo em responsabilidade parece-me um exercício arriscado, como se viu, por exemplo, na concentração no Canhão da Nazaré. A mente humana é criativa e encontrará certamente mil e uma razões para aplicar a exceção à regra a seu bel prazer.
Como dizia o diretor do jornal Público «a responsabilidade individual conquista-se mais pelo pavor do que pelo civismo». Em março, as imagens que nos chegavam da Itália, de França ou de Espanha com os alertas de hospitais no limiar da sua capacidade de internamento e da falta de ventiladores tiveram maior eficácia que todos os discursos proferidos pelas autoridades de saúde e pelo Executivo e levaram-nos a confinar antes mesmo das ordens emanadas por aquelas autoridades. Do que se conclui, como alguém dizia «Portugal é ótimo a Confinar, é Péssimo a Desconfinar».
Não é fácil tomar decisões, bem sabemos, para mais num clima de incerteza e imprevisibilidade, contudo, é possível evitar erros básicos, não tomando medidas contraditórias e inconsistentes. Se queremos que a generalidade das pessoas cumpra as regras, a mensagem tem que ser clara e consistente, de modo a que as pessoas percebam que o que lhes é pedido faz sentido.
Veja-se, por exemplo, a obrigatoriedade do uso de máscaras em espaços públicos. Foi uma medida que não mereceu grande contestação, porque as pessoas entenderam a sua utilidade. Agora parece-me bizarro autorizar uma corrida de automóveis com 27 mil pessoas nas bancadas e posteriormente proibir a deslocação de umas dezenas aos cemitérios. É este tipo de medidas que descredibilizam as instituições.
Entretanto, ontem, em entrevista à RTP, o Presidente da República afirmou que está a ser ponderado um novo Estado de Emergência para: reforçar as equipas de rastreamento e acompanhamento, permitindo alocar novos recursos para além dos profissionais em saúde com funcionários públicos e privados; haver cobertura jurídica para permitir medir a temperatura no local de trabalho assim como em locais públicos; criar condições acrescidas para a utilização de meios do setor privado e do setor social e cooperativo e, por fim, gerar condições jurídicas para limitar a liberdade de circulação (recolher obrigatório).
Marcelo deixou ainda um aviso: «há um cheiro a crise política desde que começou a pandemia», explicando que houve desacordo entre os partidos desde a primeira renovação do estado de emergência. Como se sabe, de acordo com a Constituição, a declaração do Estado de Emergência pode determinar a suspensão de alguns dos direitos, liberdades e garantias, daí alguns partidos estarem contra. A declaração do Estado de Emergência, no todo ou em parte do território nacional, é uma competência do Presidente da República, mas depende de audição do Governo e de autorização da Assembleia da República. Mesmo assim, Marcelo pede bom senso, diz que «convinha que não se juntassem três crises», a sanitária, económica, a social e a política.
Será bom que se tomem medidas para que consigamos “achatar a curva”, muito embora saibamos que isso depende sobretudo dos comportamentos adotados por cada um de nós.
Se nada for feito, adverte Marcelo Rebelo de Sousa, de acordo com os modelos matemáticos, podemos ter uma duplicação de casos a cada 15 dias, o que significará que no final de novembro, estaremos com oito mil ou nove mil infetados com o novo coronavírus, o que seria desastroso. Felizmente, até à data, a realidade não tem correspondido à progressão matemática, segundo o Presidente, ou seja, têm sido contabilizados menos casos do que os previstos, mas nunca fiando.