O discurso do Presidente da República teve consequências
Finalmente a ministra da Administração Interna demitiu-se. Depois das palavras duras do Presidente da República, no seu discurso, parecia óbvio que a ministra já não teria grandes condições para se manter em funções.
Claro que a demissão de Constança Urbano de Sousa não vai recuperar as vidas humanas que se perderam nos quatro meses de incêndios. Mas, de certa forma, este foi o primeiro e único foco de incêndio que a ministra e o Governo conseguiram apagar.
Marcelo Rebelo de Sousa foi duro no puxão de orelhas ao Governo. Antes de pedir mudanças rápidas ao Executivo, o Chefe de Estado falou como cidadão: «Por muito que a frieza destes tempos cheia de números e chavões políticos convidem a banalizar, estes 100 mortos não mais sairão do meu pensamento, com o peso enorme na minha consciência como no meu mandato presidencial».
Para Marcelo, não há mais espaço para novas tragédias Exigiu ao Governo um «novo ciclo» que ponha na agenda a reforma da floresta e a prevenção de fogos como a prioridade, deixando claro que, se tal não acontecer, não hesitará em «exercer todos os seus poderes».
Mas disse mais, disse que tem de haver uma remodelação de responsáveis e exigiu ao Parlamento que se defina na moção de censura apresentada pelo CDS: «Se há, na Assembleia da República quem questione a atual capacidade do Governo para realizar estas mudanças inadiáveis e indispensáveis então que, nos termos da Constituição, esperemos que a Assembleia diga soberanamente se quer ou não manter este Governo».
Ao longo de todo o discurso, mesmo que de forma subliminar, o Presidente deixou várias críticas ao primeiro-ministro pela gestão política dos incêndios do fim-de-semana. Primeiro, numa mensagem sentida a falar para as pessoas afetadas pelos fogos afastando-se do registo usado na véspera pelo primeiro-ministro que se cingiu às medidas a adotar no futuro e que caiu mal na opinião pública.
Depois, perante o que aconteceu, Marcelo, o Presidente dos Afetos, fez jus ao epitáfio e pediu desculpas aos portugueses pelas vítimas dos incêndios, admitindo que houve falhas e que os portugueses não reconheceram nesses momentos segurança e confiança nos poderes do estado que não estiveram à altura dos acontecimentos.
Por fim, insistiu que os poderes públicos saíram «fragilizados» e quer que «o Governo retire todas, mas mesmo todas as consequências» tendo por base as conclusões do relatório da Comissão Técnica Independente. E pediu essa avaliação na discussão do Orçamento de 2018. «Se houver margens orçamentais, que se dê prioridade à floresta e a prevenção aos fogos», porque esta «é a última oportunidade para levarmos a sério a floresta» convertendo-a «em prioridade nacional». É preciso ter meios ou «será uma frustração nacional».