O Silêncio de Marcelo
E Marcelo Rebelo de Sousa? o que pensa da atual crise política em que o país supostamente mergulhou? O Presidente sempre tão prolixo remeteu-se agora ao um profundo silêncio.
«O Presidente, ciente do poder que lhe cabia no desfecho desta crise, remeteu-se ao silêncio. Ainda bem. Mas isso não significa que tivesse sido apanhado de surpresa. Marcelo Rebelo de Sousa partiu para a China com uma ameaça velada – afirmada e desmentida por fontes do Governo – de que o primeiro-ministro se podia demitir caso houvesse uma coligação negativa no Parlamento para aprovar uma lei que contrariasse a vontade expressa do Governo de apenas descongelar as carreiras dos professores, com efeitos para o futuro, sem que isso implicasse a recuperação do tempo de serviço perdido desde finais de 2010.
Sabia, portanto, que essa hipótese existia, e custa a crer que não tenha falado com o primeiro-ministro sobre esse cenário. Não sabemos que conversas tiveram Marcelo e António Costa, antes e depois do anúncio do primeiro-ministro. Também não sabemos que conversas teve o Presidente durante o fim-de-semana em que o impasse parecia manter-se. Sabemos apenas, e para já, que os partidos da direita deram o dito por não dito e que a crise política, afinal, parece já não ter motivos para acontecer.
E sabemos também que Marcelo Rebelo de Sousa já aprendeu o valor do silêncio. Fez muito bem, ainda que seja possível imaginar que está a lutar contra a sua própria natureza. Marcelo quer ser um Presidente pedagogo, sempre o disse, e explicar aos portugueses aquilo que está a acontecer no tabuleiro político. O silêncio, no entanto, também é uma forma de intervir, e não menos importante – desde que não seja a regra.
Agora que a “crise política” está prestes a dissipar-se de vez, começa a aproximar-se o momento de se pronunciar sobre o que aconteceu. Porque o que não se compreenderá é que o Presidente, que se pronuncia sobre tudo e qualquer coisa, não tire agora conclusões e ilações políticas de uma crise que, afinal, pode nunca chegar a existir.».
Leonete Botelho, Público