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Narrativa Diária

Não escrever um romance na «horizontal», com a narrativa de peripécias que entretêm. Escrevê-lo na «vertical», com a vivência intensa do que se sente e perturba. Vergílio Ferreira

Narrativa Diária

Sab | 06.02.16

O tiro saiu-lhes pela culatra

 

O orçamento do estado, na sua última versão com as medidas adicionais de austeridade acordadas na terça-feira entre o Governo, o BE e o PCP foi aprovado pela Comissão Europeia. Mas foi preciso negociar. E o que é que isso tem de estranho? É que não se entende a atitude e a crispação do PSD e do CDS ao longo das negociações com a Comissão Europeia no âmbito do Orçamento do Estado para 2016.

A Comissão Europeia cedeu, por um lado, ao aceitar que a reversão de algumas medidas de austeridade (como a reposição dos cortes nos salários da função pública e a redução da sobretaxa). E o Governo, por sua vez, teve ceder no défice estrutural (que resulta da diferença entre as receitas e as despesas públicas, excluindo os efeitos temporários e conjunturais (como a transferência do fundo de pensões da banca para o Estado, por exemplo).

Óbvio que tudo isto acarretará algum aumento de impostos sobre o consumo, muito embora a pior cedência a Bruxelas tenha sido na TSU para os salários mais baixos. Mas só por má fé não se conseguirá vislumbrar um triunfo político para Portugal que começa a «virar a página da austeridade» ao conseguir inverter o ciclo da política orçamental e económica, embora ainda longe do que seria necessário. Igualmente importante é descobrir que negociar com os parceiros europeus é possível e desejável, na procura de convergências com a União Europeia, na construção de novos consensos que rompam com a política de austeridade que condenou a economia a uma estagnação, ao invés de aceitar alegremente tudo aquilo que Bruxelas nos queira impor, como fizeram Passos e os seus apaniguados ao longo de quatro anos.

É exatamente este o caminho que o novo Governo está a fazer, para desespero de alguns jornalistas, analistas económicos e  forças políticas à direita. Por isso, desta vez, o tiro saiu-lhes pela culatra.

Depois de todo este processo negocial e assentada a poeira, o que sobressai é a forma diplomática como António Costa e Mário Centeno geriram este dossiê.

E como afirmou Manuela Ferreira Leite, no final o governo português sai beneficiado em temos «formais e políticos» de toda esta negociação, porque «acaba por apresentar um Orçamento que tem o cuidado que as contas estejam equilibradas dentro dos critérios que estão a ser seguidos por Bruxelas e  isso é bom para Portugal e para a sua credibilidade externa, e ao mesmo tempo não tendo abdicado daquelas medidas que lhe garantia o apoio dos partidos que o apoiam na Assembleia, garantindo de alguma forma a aprovação do Orçamento».