Rescaldo do XX Congresso do PS
Temia-se que o Caso Sócrates ensombrasse o XX Congresso do PS. Mas, António Costa foi hábil e tentou desmontar a bomba relógio, antes que ela lhe rebentasse nas mãos. E conseguiu fazer esquecer Sócrates e devolver a política ao Congresso.
Com o assunto Sócrates arrumado logo no início do discurso, António Costa não perdeu tempo e passou imediatamente ao ataque às políticas seguidas por este governo, recusando entendimentos com os partidos que estão à direita do PS. Com alguma graça afirmou: «o meu filho chama-se Pedro. Gosto do nome. (…) não é uma questão de nomes, é uma questão de políticas». A contestação ao Governo e a afirmação de uma política alternativa marcaram grande parte do discurso de abertura. “Mudança” foi a palavra de ordem
A direção escolhida por António Costa já deixava antever a viragem à esquerda. No Secretariado, o núcleo duro político, são quase todos estreantes e saltam à vista nomes da ala esquerda socialista, como João Galamba e Sérgio Sousa Pinto. Da ala socrática ficou o ex-chefe de gabinete de José Sócrates, Luís Patrão. Os apoiantes de Seguro ficaram afastados do Secretariado.
O tema «Presidenciais» veio à tona, depois de Sampaio da Nóvoa ter sido aplaudido de pé pelos socialistas. Se António Guterres, o candidato natural do PS não avançar, Sampaio da Nóvoa poderá ser uma opção. Mas para Costa é fundamental que seja «um Presidente da República que renove o orgulho que todos tivemos nas presidenciais exemplares de Mário Soares e Jorge Sampaio». Ambos marcaram presença no Congresso, o que não tem sido habitual nos anteriores.
No encerramento do XX Congresso, o secretário-geral do PS rejeitou mais uma vez a direita e enviou recados para PCP e BE, que apelidou de partidos de «protesto» que não querem fazer parte da «solução», referindo o partido Livre como o único que «procura romper o bloqueio da incomunicabilidade à esquerda».
E aqui reside quanto a mim o principal problema do partido socialista. O PS é um partido pouco dado a entendimentos com outras forças políticas, porque não tem afinidades com nenhum dos restantes partidos do espetro político: se com PSD e CDS é difícil, porque não é curial criticar duramente o governo e depois coligar-se com um destes partidos á posteriori.
À esquerda (com exceção do Livre) com o PCP e BE também parece pouco provável. Isto porque aqueles partidos sempre criticaram os partidos de direita (onde se inclui o PS) e porque os seus militantes rejeitariam liminarmente tal solução. Acresce, ainda que ambos são forças políticas que jogam a sua sobrevivência em manterem-se como partido de protesto, mesmo que isso as afaste do poder. Se assim não fosse já certamente teriam desaparecido do mapa partidário.
Perante este cenário, resta a António Costa insistir no voto útil e esperar que o eleitorado lhe dê uma maioria absoluta. O que, com o caso Sócrates, afigura-se menos provável do que era há duas semanas.